O Uruguai da existência

Sempre que se aproxima o final do campeonato aparece um coro de doutrinadores a explicar-nos que os mundiais estão cada vez pior. Não contesto - estamos mais velhos, com menos paciência, e os mundiais estão cada vez pior. Mas há rasgos, zonas francas, fugazes momentos de alegria que só os mundiais permitem. Para já, e para mim, houve dois, ambos com o Uruguai em campo: o final do prolongamento no jogo com o Gana e o tempo de desconto da meia-final com a Holanda.

Alguns minutos de prazer contra muitas horas de chatice. Primeiro, aquele golo certo evitado com a mão que dá lugar a um penalty terrorista. Muito provavelmente, o penalty de toda a história que mais beneficiou o infractor. No universo da lógica, o Gana marcou o 2-1. No campo de jogo a bola não entrou. Estava mesmo escrito nas estrelas. E o desempate através dos terríveis “pontapés da marca de grande penalidade” que se seguiram não foi senão um mero formalismo de expediente para confirmar o destino.

Ontem, já no tempo de descontos, já depois de o Uruguai ter ameaçado desistir ao tirar Forlán, algo parecido esteve prestes a passar-se. Num lance rápido o jogador uruguaio marcou o 2-3 (foi Maxi Pereira mas podia ter sido qualquer outro; Forlán à parte, a equipa é feita de gente anónima, jogadores medianos que apenas ganham espessura épica com a sua circunstância). Faltavam 90 segundos para o fim dos descontos, mas o árbitro, que seguramente gosta de mundiais, resolveu dar mais algum tempo para além do tempo. E nesse tempo suspenso, o Uruguai foi ainda capaz de pôr quatro ou cinco bolas na área. De cada vez que tal acontecia, por mais inconsequente que se adivinhasse ser, todos agradecemos a existência dos mundiais. Dos tais que - é certo - estão cada vez pior.