Parece que “corre uma interessante teoria” segundo a qual quem escreve textos de opinião beneficia de um estatuto de inimputabilidade. Parece, porque, na realidade, esta teoria (apesar de sugestiva) não corre em lado nenhum. Limita-se a existir estática, quieta e instrumentalmente parada no último artigo do meu amigo Pedro Marques Lopes. Como um alvo imaginário contra o qual se atiram dardos. Ou se constrói uma crónica.
Sinceramente, gostava que o Pedro me satisfizesse duas curiosidades: primeiro, quem são os defensores de tal teoria e por onde têm eles andado a defendê-la; segundo, quem são as vitimas dos insultos e das calúnias dos terríveis opinadores inimputáveis.
Estamos de acordo que, numa democracia liberal, o direito de reagir judicialmente contra ofensas morais é um direito essencial. As palavras têm consequências, e sem mecanismos de defesa da honra e do bom nome a liberdade de expressão desemboca na selvajaria. Mas em Portugal - e olho agora para o código penal - já há suficientes instrumentos para responder aos abusos da liberdade de expressão. Quer a difamação quer as injúrias são crimes previstos e punidos seja quem for o agente. Logo, por mais que procure, não vejo onde está esse estatuto especial do opinador. Aliás, o nosso primeiro-ministro é um bom exemplo de que os mecanismos existem e podem ser usados: tendo-se sentido atingido na honra, não se coibiu - e bem, porque é o seu direito - de avançar com uns quantos processos judiciais contra os autores dos textos em causa.
Agora o que ainda não há – e se calhar é disso que o Pedro se queixa – é uma acção judicial para travar a percepção geral das coisas. Uma acção para usar contra aquilo a que se poderia chamar de volksgeist do quotidiano. Se o povo comenta no café, o funcionário se interroga no trabalho, o jornalista pergunta no jornal, e o colunista opina sem ser indiferente a tudo isto, o que é que eu - não-corrupto, não-intrujão, não-ladrão - posso fazer?
Processar tudo e todos, de facto, talvez não seja o mais aconselhável.
PS: Há, no entanto, um submundo onde a calúnia se tem vindo a acomodar: um tal de anleite , referindo-se a mim, diz que sou neto de avô incógnito. A afirmação é patética e esdrúxula, porque falsa e fácil de desmentir (os meus avôs são tão incógnitos que até constam do IMDB). Mas isso pouco importa (desde quando é que um avô incógnito desqualifica alguém?). O sintomático é que esta gente se sente cada vez mais à vontade para vomitar barbaridades em público. Sentimento de impunidade? Possivelmente. Mas também prova da irrelevância daquilo que dizem.