Muita gente não percebeu ainda o que separa o julgamento da moralidade pública da moralidade privada de um governante. Muita gente não percebe ou não quer perceber que um governante até pode ser um canalha em privado desde que seja rigoroso e confiável no domínio das suas competências públicas. Este último plano é tudo o que nos deve interessar. Os julgamentos do carácter de um político devem restringir-se à moralidade como ele exerce as suas funções: à ètica pública e não à ética privada, ao modo como cumpre as convenções democráticas, respeita os adversários e as regras do jogo político. Neste plano estamos autorizados a ser exigentes e atentos. Por isso, este artigo da Constança Cunha e Sá, ao formular uma crítica ao moralismo - "no momento em que se salta da crítica política para análises moralistas sobre o carácter do primeiro-ministro" - , é um texto errado por não se ocupar daquela subtil distinção. O que está em causa. o que sempre esteve em causa, é tão-só um julgamento público.